O Australopithecus afarensis, cujo apelido é “Lucy” e viveu 3.2 milhões de anos atrás, era o fóssil mais remoto antes da descoberta de “Ardi”, que recebeu o nome de Ardipithecus ramidus.
Embora o fóssil da primeira espécie tenha sido achado em 1974 e o da segunda em meados dos anos 90 e distantes 74 km um do outro, uma pesquisa deste porte e com o escasso material disponível toma tempo para realizar-se.
Ainda que cientistas sustentem que o familiar mais próximo da humanidade viveu pelo menos seis milhões de anos atrás, a descoberta de “Ardi” derruba a tese de que viemos de chimpanzés e gorilas, uma vez que aquela possui características distintas destes e dos humanos, como a de usar os quatro membros em árvores e, no chão, somente dois. “Ardi” comportou-se como uma possível linhagem comum de humanos e primatas.
Esta descoberta, para alguns, parece ter o efeito contrário à de que a Terra não é o centro do universo.
Na primeira situação, não descenderíamos de macacos, enquanto, na segunda, destitui-se aquele pretenso papel de centralidade dos humanos neste planeta, que é apenas um a mais nessa imensidão cósmica. Provoca-me um sentimento impotente e nebuloso, mas há que admitir que somos grãos.
Como teriam sido – não só anatomicamente – estes ancestrais aos quais se atribuiu o apelido de “Ardi”?
Como contribuem para as incertezas da atualidade? É interessante notar em que solo pisam as discussões científicas mais polêmicas: se viemos de um ancestral ou de outro, como o universo surgiu e se expande, usos éticos da genética, temor (não infundado) de vírus mortais que poriam em risco a espécie humana.
Apesar de serem interessantes as descobertas e as pesquisas que se têm feito sobre a “origem das espécies”, em alusão a Darwin, inquieta-me que um número considerável de seres humanos, que de nenhuma maneira são sinônimo das virtudes que se lhe costumam atribuir à espécie, continuem matando, mentindo, manipulando, invadindo países, promovendo massacres, odiando, invejando, roubando.
Longe de crer que somos humanos, enquanto eles, animais, como se aí houvesse uma distinção de grau, minha visão é de que somos apenas uma variedade do que se costuma chamar vida animal.
Creio que Darwin comentaria a descoberta de “Ardi” comparando 4.4 milhões de anos passados com a perspectiva de arrefecimento dos ânimos de que qualquer transformação de nossa espécie seja instantânea ou viável dentro de poucos anos. Temos menor quantidade de pelos, mas que não desaparecem; a cabeça maior, mas que continua albergando pensamentos monstruosos; a altura maior, mas para que uns se sintam melhores ou piores.
O que pensarão de nós os que escavarem nossos fósseis depois de outros quatro milhões de anos?
Bruno Peron Loureiro é analista de relações internacionais.
Crédito:Cris Padilha
Autor:Bruno Peron Loureiro
Fonte:Universo da Mulher