A ortorexia nervosa extrapola os limites da vida saudável e passa a prejudicar os aspectos físicos, psicológicos e sociais do indivíduo
Embora cuidar da saúde seja algo necessário para se adquirir mais qualidade de vida, estudos clínicos bem como médicos especialistas em nutrição e bem-estar afirmam que a preocupação obsessiva e patológica com os hábitos saudáveis pode dar início a uma grave doença, chamada ortorexia nervosa.
Apesar de ainda não ser muito conhecida, a ortorexia foi descrita pela primeira vez pelo médico americano Steven Bratman, que se descobriu ortoréxico, ou seja, "viciado em comida saudável", e batizou esse termo baseado num neologismo grego (orthós significa "correto" e "verdadeiro" e oréxis quer dizer "apetite"). Embora cada vez mais comum nos consultórios médicos, essa doença não figura nos manuais de psiquiatria e também não é reconhecida pela Organização Mundial de Saúde (OMS), principalmente porque ainda é vista como um distúrbio comportamental e um estilo de vida.
Os ortoréxicos não consomem, em hipótese alguma, produtos ricos em gorduras, conservantes, herbicidas, pesticidas, corantes, carnes vermelhas ou outros agentes que podem ser prejudiciais à saúde. Nesse caso, diferentemente das pessoas anoréxicas, que se preocupam apenas com as calorias e o ganho de peso, a obsessão é pela qualidade e procedência dos alimentos e a busca incontrolável por uma dieta equilibrada e o mais natural possível, livre de impurezas.
Segundo a nutróloga Daniela Hueb, da Associação Brasileira de Nutrologia (ABRAN), é importante que se tenha consciência da necessidade de adotar uma alimentação saudável, principalmente porque ela pode ajudar a prevenir várias doenças, porém não devemos buscá-la de forma obcecada. "Torna-se disfuncional quando interfere negativamente na vida da pessoa, ou seja, perde-se o objetivo inicial de vida saudável e passa a prejudicar os aspectos físicos, psicológicos e até sociais do indivíduo", disse.
Na maioria dos casos, a perda da sociabilidade é inevitável, uma vez que os ortoréxicos preferem não se alimentar em locais públicos ou até mesmo na casa de parentes e amigos, se não tiverem certeza da qualidade e procedência dos alimentos. Por conta disso, a doença geralmente aparece associada a quadros de depressão ou transtornos obsessivos compulsivos.
Danos à Saúde:
Como a seleção dos alimentos de um ortoréxico fica muito restrita, as pessoas passam a consumir poucos e determinados alimentos, o que acaba prejudicando a saúde. Segundo Daniela Hueb, essa obsessão por uma alimentação saudável é apenas o indício de uma desorganização interna maior e mais complexa. "Trata-se de um desarranjo psicológico, por isso o tratamento deve ser composto por idas ao nutricionista ou nutrólogo e também ao psiquiatra", explica.
A principal conseqüência física desse comportamento é o início de uma alimentação desequilibrada, pois os ortoréxicos retiram do cardápio alimentos importantes como a carne vermelha. Além disso, cortam os laticínios e os ovos, fazendo cair substancialmente a ingestão de vitamina B12, cálcio, zinco e ferro.
Caso não exista uma substituição dos alimentos por outros de igual teor nutritivo, vários prejuízos à saúde podem ocorrer. Entre eles, a anemia, a carência vitamínica e também as hipervitaminoses, causadas pelo excesso de complementos vitamínicos. Além disso, a falta de cálcio, devido à recusa ao consumo de leite e derivados, pode constituir em um sério risco à saúde óssea, gerando osteoporose.
A obsessão por comer bem
As pessoas que sofrem de ortorexia passam horas e horas percorrendo prateleiras de supermercados lendo os rótulos dos produtos. Gastam muito tempo pesquisando em livros e na Internet os ingredientes que compõe os alimentos industrializados e chegam a percorrer longas distâncias a procura de alimentos orgânicos, aqueles isentos de agrotóxicos. A fixação é tão grande que, em grau elevado, chegam num ponto de utilizar uma panela exclusiva para cada grupo alimentar.
"Beber água e utilizar para o cozimento dos alimentos, só se for mineral. Quanto aos adoçantes dos refrigerantes, nem pensar. E ainda, os ortoréxicos passam a recriminar as pessoas ao seu redor que consomem tais produtos, sem contar que só conseguem falar sobre esse assunto", alertou a nutróloga Daniela Hueb.
Critérios de diagnóstico:
De acordo com a especialista, as pessoas perfeccionistas e preocupadas demais com a qualidade de vida têm uma propensão maior a desenvolver a doença. Além disso, a ortorexia pode atingir homens e mulheres de diferentes faixas etárias. "Pode acontecer com qualquer um, mas o início da doença aparece geralmente na adolescência, quando os jovens ficam mais ligados em manter a forma e a saúde em geral", explica Daniela.
Vale a pena ressaltar que não é porque a pessoa é vegetariana ou porque prefira frutas e verduras à ovos e carnes, que pode ser diagnosticada como ortoréxica. Abaixo, seguem alguns critérios que ajudam a identificar uma pessoa portadora da doença:
1) Passar mais de três horas por dia pensando em como ter uma dieta saudável;
2) Preocupar-se mais com a qualidade do que com o prazer de comer;
3) Conforme aumenta a pseudoqualidade da alimentação, diminui a qualidade de vida;
4) Complexo de culpa quando se transgride nas convicções dietéticas;
5) Planificar hoje o que se vai consumir amanhã (não se deitam sem programar as refeições do dia seguinte);
6) Isolamento social pelo regime dietético. Por exemplo, aquelas pessoas que não comem com os amigos porque não confiam no que se come por aí, e chegam a ponto de levar a própria comida ou não participam da refeição.
Tratamento
A condição afeta igualmente os homens e as mulheres. Os tratamentos dispensados devem ser de psicoterapia comportamental, cognitiva e até medicamentoso com um médico psiquiatra. É interessante também um aconselhamento nutricional.
A existência desse transtorno não significa, no entanto, que se deva deixar de lado a preocupação com uma alimentação saudável. Uma dieta com grande variedade de vegetais pode prevenir aproximadamente 20% dos casos de cânceres. Por outro lado, estão aumentando também os problemas de saúde decorrentes dos maus hábitos alimentares, como a obesidade e as doenças do coração.
"O negócio é não exagerar na vigilância alimentar e sim comer bem sem paranóia, ser sociável e também se dar o luxo de ter umas férias nutricionais", finaliza a especialista.
Sobre a especialista:
Daniela Hueb é médica graduada pela Universidade de Alfenas, com especialização
Hueb é ainda membro efetivo da Sociedade Brasileira de Medicina Estética, Academia Brasileira de Dermatologia, Sociedade Francesa de Medicina Estética e Sociedade Médica Brasileira de Intradermoterapia. Também participa da Associação Brasileira de Nutrologia, Sociedade Brasileira de Antienvelhecimento, Academia Americana de Dermatologia e Sociedade Brasileira de Laser. Daniela Hueb é sócia-diretora da clínica médica integrada que leva o seu nome, especializada em diversos tipos de tratamentos, como acne, obesidade, celulite, cirurgia estética sem cicatrizes, peeling, entre outros.
Crédito:Cris Padilha
Autor:Katia Meirelles
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