Rio de Janeiro, 14 de Maio de 2024

Enxaqueca: a dieta pode contribuir para a qualidade de vida do paciente?

Enxaqueca: a dieta pode contribuir para a qualidade de vida do paciente?
A relação entre um alimento e a dor de cabeça, em termos gerais, é difícil de ser comprovada por se tratar de sintoma subjetivo, que pode sofrer várias outras influências da vida diária e que difere muito de uma pessoa para outra.
 
“Felicidade é não ter dor de cabeça”... Essa é uma definição de felicidade que só é perfeitamente compreendida pelas pessoas que sofrem de uma das dores mais freqüentes e incapacitantes que existem: a enxaqueca.
 
Isso porque o sofrimento é crônico, intenso e ameaçador, podendo aparecer quando menos se espera, pondo a perder os planos profissionais e o convívio social.

Segundo a Sociedade Brasileira de Cefaléia, 30 milhões de brasileiros sofrem com a enxaqueca. A incidência na população feminina pode atingir 18 a 20%.
 
Cerca de 75% dos sofredores de enxaqueca são mulheres. A Sociedade Internacional de Cefaléia reconhece mais de 150 tipos de dores de cabeça, desde as tensionais, normalmente associadas ao estresse, até as que são resultantes de ressaca, aneurismas, medicamentos como o Viagra e tumores. 
 
A pior delas, felizmente muito rara, é a cefaléia em salvas, geralmente ao redor de um dos olhos e das têmporas, descrita como insuportável e que leva o paciente a atitudes extremas como a bater a cabeça contra uma parede.
 
Sem qualidade de vida
 
A enxaqueca é muito mais que uma dor. É um grande mal estar, que se instala às vezes lenta, às vezes abruptamente, dando a sensação de que a cabeça está enorme, pulsando, martelando ou que o cérebro está sendo pressionado num ritmo enlouquecedor.
 
A visão de qualquer tipo de luz é uma tortura; os odores, um sacrifício, mesmo os mais agradáveis; os sons transformam-se em ruídos ensurdecedores, o estômago revira e os vômitos são a conseqüência natural.
 
Esse martírio pode durar dias, num vai e vem de intensidade maior e menor que impede a realização da maior parte das atividades do dia e impossibilita a normalidade da vida.
 
Muitos fatores tornam a enxaqueca uma doença de causas indecifráveis.
 
O primeiro deles é que não há sequer um exame laboratorial que declare a dor como enxaqueca.
 
Todos os exames são normais, desde os exames bioquímicos até os mais sofisticados métodos de imagem. Esse diagnóstico é clínico e baseado na descrição do paciente.
 
Segundo, a dor é um sintoma que depende do limiar de tolerância dos pacientes, o que é muito diferente de pessoa para pessoa, pois umas chegam ao pronto-socorro em verdadeira crise de histeria desencadeada pela dor, enquanto outras, mesmo referindo dor forte, preferem se fechar num quarto escuro até obter alívio. Terceiro, a enxaqueca é uma dor com diferentes e até opostos fatores desencadeantes, tornando difícil agrupá-los dentro de uma única causa.
 
Dormir muito ou dormir pouco, muito calor ou muito frio, muito café ou a falta dele, bebidas alcoólicas, jejum prolongado e refeições copiosas, oscilações hormonais nas mulheres, estresse, medicamentos, sedentarismo e determinados alimentos...
 
Além de tudo isso, o uso crônico de analgésicos, principalmente os que contém cafeína, pode levar à cronicidade da dor, que passa a ser diária, o que leva à auto-medicação com doses progressivamente maiores de analgésicos.
 
Interferência da alimentação
 
A alimentação, para as pessoas que têm enxaqueca, gera uma polêmica ainda maior porque é difícil provar que um sintoma subjetivo e que não pode ser aferido ou quantificado possa ser causado por um determinado alimento. Mesmo assim, crescemos ouvindo muitas histórias sobre alimentos que causam e que aliviam a dor de cabeça.
 
Um dos fatores mais importantes no desencadear da enxaqueca, e que já estamos cientes, é que ficar sem comer ou fazer jejuns prolongados é pior do que os vários alimentos rotineiramente relacionados à dor.
 
Logo, uma rotina alimentar de refeições e lanches é importante no tratamento da enxaqueca, muito mais do que a privação de certos alimentos, muitas vezes erroneamente relacionados à ela, simplesmente porque foram consumidos em um dia de  dor.
 
Outro fator alimentar relacionado à enxaqueca é o consumo de bebidas alcoólicas.
 
Entre elas, as bebidas fermentadas como a cerveja e o vinho, principalmente o tinto.
 
Finalmente, o fator mais complexo como causa de enxaqueca e que envolve vários tipos de alimentos: a ingestão freqüente e intensa de cafeína. Os relatos são mais contundentes em relação ao café, por se tratar de alimento de consumo diário e muitas vezes exagerado.
 
Mas a cafeína é encontrada em muitos refrigerantes do tipo cola, chocolates e chás escuros, como o chá mate. Acredita-se que apenas três cafés expressos por dia sejam suficientes para causar enxaqueca.
 
Aqui, vale lembrar que há relatos de dor relacionada ao consumo da bebida, mas o mais comum é a dor de privação, ou seja, quando um organismo, acostumado ao consumo diário de cafeína se vê privado da mesma. Muitas vezes, uma simples xícara de café é suficiente para o alívio da dor matinal em consumidores assíduos de café. Logo, algumas vezes, o café pode tratar a enxaqueca, como numa síndrome de abstinência de um viciado em cafeína.
 
Por esse motivo, a presença de cafeína em muitos remédios analgésicos é desaprovada pela maioria dos especialistas em enxaqueca porque pode levar à dor de cabeça de privação, quando se interrompe sua utilização freqüente.
 
Faz parte da orientação desses pacientes o alerta para que evitem a auto-medicação, uma vez que ela pode gerar dependência de doses analgésicas a cada dia maiores. 
 
Com relação aos outros alimentos, é importante a descrição de muitos pacientes que relacionam a dor de cabeça aos chocolates, embutidos e laticínios, principalmente queijos amarelos.
 
Nessa lista, nem as frutas ficam de fora, principalmente as cítricas como o maracujá, a laranja e o abacaxi. Se fôssemos mais exatos, a lista de alimentos seria infindável e poria em risco a variedade nutricional tão importante aos nossos pacientes.
 
Uma orientação importante sobre os alimentos é que o paciente com enxaqueca observe muito atentamente sua rotina nos dias que sente dor, pois suas considerações serão valiosas na orientação de suas dietas.
 
Não há base científica para suspendermos determinados alimentos das dietas de todas as pessoas com enxaqueca, por isto é tão importante o relato individual.
 
Apesar dos registros tão contraditórios nos gatilhos da dor, podemos orientar, de uma maneira geral, que os pacientes com enxaqueca:
 
(1)   Façam suas refeições com intervalos regulares, de preferência 3 refeições e 2-3 lanches diários evitando longos intervalos entre elas;
(2)   Bebam água com regularidade, uma vez que quando a sede aparece, isto significa que já ocorreu depleção de água no organismo e estamos desidratados;
(3)   “Não durmam mais ou menos”, procurem manter suas horas de sono semelhantes, tanto na semana, quanto nos finais de semana;
(4)   Evitem o consumo de bebidas alcoólicas;
(5)   Façam atividade física, principalmente com alongamentos que privilegiem a coluna cervical. Nas crises de dor, deve-se evitar o esforço físico e mental;
(6)   Não tirem conclusões precipitadas ou baseadas em um único episódio de dor, pois correm o risco de  relacionar um alimento muito apreciado com a enxaqueca, sem que isso seja verdade. É recomendável observar, outras vezes, a influência desse alimento;
(7)   Evitem o consumo de mais que 2-3 xícaras de café expresso ou 3-4 cafés comuns ao dia. Se existir o consumo abusivo de café, a redução deve ser lenta e gradual;
(8)   Evitem a auto-medicação e procurem a orientação de um neurologista para acompanhar seu tratamento.
 
Além das orientações acima, a alimentação das pessoas com enxaqueca deve ser individualizada, privilegiando e atendendo às necessidade básicas de cada um e baseada numa profunda avaliação de cada paciente sobre si mesmos.
 
 
 
 
 
Ellen Simone Paiva – Endocrinologista e nutróloga. Diretora clínica do
 CITEN - Centro Integrado de Terapia Nutricional.
Endereço: Rua Vergueiro, 2564.
Conjuntos 63 e 64
Vila Mariana
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Tel: (11) 55791561.
 
 

Crédito:Fatima Nazareth

Autor:Márcia Wirth

Fonte:Excelência em Comunicação