Rio de Janeiro, 21 de Novembro de 2024

Você tem Medo de ter Medo?

 
Há muitos anos, um mestre segurou minhas mãos e me disse que o medo nos faz ver fantasmas onde não existem.
 
Entrar em um quarto escuro pode ser aterrorizante: basta “enxergar” dentro dele uma figura ameaçadora, que nada mais é que um casaco pendurado no espaldar de uma cadeira.
 
Mas só sabemos disso se acendermos a luz e reconhecermos a realidade como ela é.
 
Tenho observado ao longo de anos de trabalho que, para enfrentar os nossos medos, basta acender dentro de si a luz que foi apagada em algum momento da vida por mãos invisíveis e criou ambientes sombrios no nosso inconsciente, como certas palavras ouvidas no meio familiar, no círculo social ou nos ambientes de trabalho que diminuem e minam a nossa auto-estima, e dão forma às figuras que bloqueiam a nossa criatividade e o nosso sucesso.
 
Enquanto isso, um mundo altamente competitivo nos empurra para desafios que vão desde a busca de trabalho à conquista do par amoroso, com um discurso tirânico de perfeição e assertividade.
 
Mais de duas décadas treinando pessoas na área da comunicação me permitem dizer que o monstro do quarto escuro engole todo tipo de pessoas, que por desconhecerem a própria luz deixam de dar valiosas contribuições aos grupos a que pertencem ou mesmo se tornar profissionais competentes e dedicados.
 
Percebo também que antes de desenvolver a habilidade de falar em público, essas pessoas precisam ser conduzidas para dentro de si mesmas para descobrir suas potencialidades, seus dons e talentos atrofiados pelo medo e suas variantes.
 
Auto-imagem negativa, excesso de autocrítica, mensagens de menos valia, insucessos na vida pessoal e profissional, falta de treino ou de conhecimento sobre o assunto são algumas das inúmeras caras do medo que se transformam em armadilhas perversas para uma carreira promissora.
 
Sem saber como lidar com essa cadeia de forças paralisantes, o indivíduo abre as portas para a frustração, a desmotivação e a autosabotagem.
 
Assim está montado o círculo vicioso que o impede de ser mais!
 
Ser mais não é ser perfeito, não é ter as melhores histórias ou ser o mais belo do quarteirão.
 
É, antes, empenhar-se para descobrir que voz é essa que insiste em dizer que o seu lugar é nos bastidores e não sob os holofotes; que a timidez é incurável; que a platéia vai rir de você; que fala boa é a do âncora do telejornal; que inteligente é o Bill Gates...
 
E você não passa de uma caricatura mal-feita.
 
De onde vem essa voz?
 
Ela é sua ou foi alguém que escreveu esse texto e você assinou embaixo?
 
O que tenho observado ao longo das extensas horas de treinamento é que o medo não é exatamente do microfone, da câmera ou do PowerPoint.
 
Com alguns exercícios e certas dinâmicas de grupo até o mais tímido se aventura a assumir um lugar no centro; o mais nervoso aprende a respirar e a controlar sua instabilidade; o mais debochado (que assim disfarça a sua insegurança) passa a ouvir e a colaborar; o tremor das mãos e a secura da boca são vencidos por gestos de confiança e discursos mais claros. Maravilhados, todos descobrem que onde antes se movimentavam às cegas, a luz começa a revelar novas trilhas e pequenas clareiras para repousar do cansaço que o medo gerou.
 
Mas sabemos que o fantasma não é coisa que se espante com exorcismos, dentes de alho ou um dia de integração na empresa.
 
Ele tem uma incrível capacidade de dar meia-volta... e nos aprisionar outra vez.
 
O chefe de cara amarrada, a nova namorada, a mudança de cargo, o bebê que não estava nos planos, a perda de um ente querido, um casamento que não vai bem, tudo pode ser uma porta aberta para deixar entrar o vampiro de dentes afiados.
 
E o pescoço mais próximo, claro, é sempre o seu, caso os valores positivos que começaram a ser construídos ainda não estejam fortalecidos.
 
Se não há magia nem milagre que nos façam amanhecer belos, charmosos e falantes, só nos resta trabalhar para alcançar a excelência pessoal.
 
E é muito trabalho!
 
Primeiro tire o lixo emocional amontoado nos espaços sombrios que sufoca e contamina.
 
Feita a faxina, que sempre requer a ajuda de um terapeuta, um coach ou outro profissional que conduza o processo de autoconhecimento, surge o que há de melhor.
 
Prepare-se: focar os conhecimentos, habilidades e atitudes necessárias para a excelência na comunicação e nas relações interpessoais. Organização e planejamento promovem autocontrole e autoconfiança.
 
Crie um plano de ação: estabelecer as metas e as etapas de trabalho, sistematizar idéias e estratégias pessoais.
 
Fortaleça a auto-estima: todos são merecedores de respeito e crédito do meio em que atuam. A maneira de ver a si mesmo e um trabalho constante de valorização dos pontos fortes contribuem para o equilíbrio.
 
Resgate imagens mentais positivas: atitudes mentais positivas atraem ouvidos receptivos. Antes de uma exposição sintonize-se com fatos agradáveis e sentimentos prazerosos.
 
Responsabilize-se pelo sucesso: o medo não permite que se assuma a responsabilidade pelo próprio sucesso. A maturidade psicológica e emocional ajuda a avançar nos processos de liderança e na construção de uma carreira.
 
Permita-se errar: treinar, acertar e errar é o tripé que sustenta as habilidades. É por tentativa, erro e correção que se alcança mais qualidade e segurança nas relações com o mundo.
 
E aquele quarto escuro com pequenas clareiras se transforma em um salão iluminado, amplo o bastante para treinar os passos que o levarão a transpor as fronteiras de si mesmo e ampliar os seus horizontes.
 

Crédito:Aaron Anderson

Autor:Eunice Mendes

Fonte:Universo da Mulher