Crescendo
“Trabalho desde os 12 anos, na farmácia do meu pai, que precisava de ajuda”, conta o estudante de Administração Luiz Augusto Fernando Geraldo. Hoje, aos 20 anos e à procura de um estágio, Luiz sente-se mais seguro para exercer uma função em sua área.
Cássia Massi, estudante de Turismo de 22 anos, ainda acrescenta:
“O trabalho deixa a gente mais ocupado. Eu não quero ficar parada”. Trabalhando desde os 15 anos, Cássia está atualmente em uma companhia aérea. Perguntada sobre o que aprendeu nesses anos de “labuta”, não pensa duas vezes: “Quanto mais eu trabalho, mais eu vejo como eu não sabia nada no começo e como tenho crescido nos últimos anos”.
Estudantes do 2º colegial, Fernanda Tronco e Felipe são dois exemplos de quem concilia ensino médio e trabalho.
Os dois têm 16 anos e trabalham não por obrigação, mas por vontade. Ambos foram incentivados pelos pais. Fernanda confere contas na empresa do pai. Felipe trabalha numa produtora de vídeo há dois anos.
“Comecei a trabalhar porque não fazia nada”, conta Fernanda. Hoje ela acredita que com a experiência foi criando mais responsabilidade.
E no fim do mês...
Um outro benefício do trabalho é a remuneração, o salário.
Aquele dinheirinho suado e merecido no fim do mês.
Uma pesquisa recente do Centro de Integração Empresa-Escola (CIEE) apurou que a independência financeira é a segunda maior preocupação entre jovens de 16 a 25 anos, só perdendo para o desemprego.
Como define a estudante de Psicologia, Gabriela Lima, 19 anos, uma das grandes vantagens do trabalho é a chance de ganhar dinheiro e “poder fazer o que quiser sem dar satisfação pros pais”.
É claro que bancar uma vida sozinho é praticamente impossível nesta situação, mas o dinheiro ou bolsa-auxílio recebidos podem servir para pagar cursos, baladas e ainda – para aqueles mais precavidos – guardar um tantinho na poupança.
Um aprendizado essencial
Estágio, bico, vender roupas numa loja, consertar o computador da vizinhança, ajudar na empresa da família... Tudo é válido.
Na corrida para o amadurecimento e na busca de uma posição no mercado, experimentar o mundo do trabalho desde cedo passou a ser uma boa saída. Ironicamente, ficar de bobeira em casa, assistindo ao mundo girar pela TV, é que passou a ser visto como perda de tempo.
Questão cultural
Segundo a professora de psicologia Yvette Piha Lehman, da Universidade de São Paulo (USP), isto tudo é produto de uma grande mudança cultural ocorrida no Brasil nos últimos dez anos.
“Tínhamos uma tradição muito grande, principalmente na classe média, de que o estudo vem em primeiro lugar e só depois de formado o jovem se responsabilizaria pela vida”, explica, “o mundo profissional ficava muito distante da vida do estudante. Ele era preparado para coisas difíceis, mas mal sabia lidar com coisas simples, como pagar uma conta. Enquanto isso, em outros países, desde os 14 anos, já era praxe o jovem conseguir sua autonomia em empregos informais”.
A virada nesta forma de pensamento ‘brasileira’ teria se dado na marra: com a crise econômica e com o desemprego.
Empregos “braçais” e menos “intelectuais” agora são bem-vindos. “Não importa qual seja o trabalho, é uma aprendizagem. É a aprendizagem que o próprio espaço dá que muitas vezes é mais importante do que a própria remuneração, e isto é algo que um livro não dá. Cada vez mais os pais estão atentos ao prejuízo acarretado ao jovem que não convive com o ambiente profissional desde cedo”, conta a Dra. Lehman.
A Dra. Lehman sabe bem do que fala. Coordenadora do Serviço de Orientação Profissional da USP e do Laboratório Labor, convive com as dúvidas, frustrações e conquistas de centenas de jovens que passam por lá regularmente.
Segundo ela, raramente a busca por um emprego acontece por pura iniciativa do jovem. Na maioria dos casos, o start é dado quando se percebe que só o estudo não é suficiente. Este choque, o medo de não estar maduro para o mercado depois de formado, faz com que o jovem queira trabalhar mais cedo.
Vantagens
“Antes de trabalhar, o grupo de pessoas que um jovem conhece é muito fechado. É a escola, a família, os vizinhos... O mundo do trabalho lhe oferece um grupo muito mais heterogêneo, com relações novas”, explica a Dra. Lehman.
Dentre as vantagens enumeradas pela psicóloga, a maturidade e o espaço social obtidos ao se relacionar com pessoas tão diferentes são algumas das grandes vantagens de trabalhar cedo. “O jovem que vai trabalhar tece uma rede de contatos, de coisas que ele mesmo vai conquistando”, ilustra.
Conciliando
Certo. Trabalhar é bom, mas estudar também é indispensável.
“Muitas vezes esta é a maior angústia dos pais: se os filhos – ao entrarem no mundo adulto do trabalho – serão capazes de fazer suas outras atividades com responsabilidade e sucesso”, conta a Dra. Lehman.
Para que isso não ocorra, ela sugere que os pais fiquem atentos às prioridades dos filhos e segurem um pouco a “paixão” que acomete os jovens algumas vezes. “Deixar de estudar pode prejudicá-lo a longo prazo, pois sem estudo não é possível conquistar outros espaços”, explica.
Apoio dos pais
A realidade do trabalho mudou muito ultimamente. Os adultos percebem que não podem mais oferecer modelos, porque os modelos e os valores profissionais mudaram muito. Aos pais cabe perceber que quando um jovem se dispõe a trabalhar ele está aceitando todas as implicações do mundo adulto.
“Os pais devem entender que isto é uma vontade, uma garra e uma prova de que a idéia de ser adulto não é tão inibidora assim para aquele jovem”, conclui a Dra. Lehman.
E agora?
Uma vez dentro, como fazer para manter um emprego?
Sim, o choque inicial é um dos maiores medos dos jovens. Segundo Vera Marques, Supervisora de Acompanhamento de Estágios do CIEE, a imaturidade e inexperiência são as características óbvias num jovem.
É preciso aprender a cumprir ordens e horários, entrar numa rotina de trabalho e atender às orientações dadas. “Mas é o dia-a-dia que vai fazer com que o jovem desenvolva o senso de responsabilidade, a mudar seu relacionamento com as pessoas e a crescer profissional e pessoalmente”, explica.
Yvette Lehman concorda que só o tempo traz a tranqüilidade.
“A sensação que tenho é como quando o jovem vai para a escola pela primeira vez”, conta, “de repente, ele se depara com um mundo novo e a adaptação à ele é progressiva.” Siglas e o vocabulário típico do ambiente de trabalho podem em princípio assustar o jovem, mas é preciso lembrar que a resistência à estes solavancos mostram sua força e sua capacidade de adaptação a um mundo totalmente diferente ao qual estava acostumado.
Crédito:Anna Beth
Autor:Redação
Fonte:Terra