Rio de Janeiro, 26 de Abril de 2024

Grisalha, sim. E daí?

Grisalha, sim. E daí?
Prateadas ou brancas, é cada vez maior o número de cabeças femininas que desafiam o estigma do grisalho sinônimo de velhice.
 
Ao se libertar da escravidão da tinta, a designer de jóias Claudia Duarte viu com prazer seus cabelos recuperarem a beleza mas enfrentou várias críticas, principalmente das mulheres.
 
— Quando comecei a adotar o visual grisalho, foi complicado no início. Detesto cortar cabelo e tive que passar um bom tempo com ele preso mas não me arrependo, meu cabelo ganhou vida, posso sair com ele molhado e não preciso me preocupar com escova ou creme. Ganhei em liberdade e qualidade. A reação das amigas, no entanto, foi um escândalo. Ficaram horrorizadas. Uma delas me perguntou se eu estava doente. Outras me imploraram para não fazer isso. A idéia do cabelo branco incomoda mais do que a própria estética — conta Claudia, que acabou convertendo a fotógrafa Márcia Ramalho ao look.
 
No caso da fotógrafa, a transformação foi radical. Habituada a andar sempre de terno e super formal, Marcia começou a nadar em julho do ano passado no master do Fluminense. Parou de pintar os cabelos e viu com prazer que o cloro ainda reforçava a beleza dos fios prateados. Hoje, ela é a oitava mulher mais rápida da América do Sul, terceira colocada no ranking estadual, uma grisalha esportiva que faz musculação duas vezes por semana e por baixo do blazer Donna Karan não abre mão do relógio-cronômetro Triax da Nike.
 
— Não uso maquiagem nem pintura nas unhas. Gosto nos outros mas em mim não. Há três anos, num festival de Cannes, ficou na minha cabeça a imagem de um anúncio da Levi’s que mostrava uma gata de costas com magnífica cabeleira branca. De frente, era uma senhora, capaz de transmitir uma vitalidade e um poder incríveis. É uma questão de você se olhar e saber fugir à regra — diz Márcia, que está fazendo fotos do Rio de Janeiro para uma coleção sobre Vinícius de Moraes, editada pela Companhia das Letras.
 
Segundo Márcia, geralmente as mulheres se importam mais com a mudança, principalmente quando estão com os maridos do lado. Ficam constrangidas, sentem-se flagradas na idade.
 
Lucia Simas, gerente de marketing do joalheiro Antonio Bernardo, não defende a bandeira do cabelo branco.
 
— A decisão varia de acordo com cada um. Mas para mim, a vida ficou mais fácil, pois eu pinto desde os 35 anos. Sempre fui loura, por isso muita gente confundia e até se decepcionava quando descobria que os reflexos eram brancos mesmo. Ouvi muito: “Nossa! Você encarou de frente!”. Vivemos num país jovem, obcecado pelo mito da loura. Toda mulher, quando começa a ficar de cabelo branco, pinta e acaba virando loura. O corte é importante para não ficar com ar desleixado. Mudei a maneira de me maquiar e de usar jóia. Agora prefiro ouro branco em vez de amarelo. A maquiagem é mais leve. O cabelo louro levanta além da conta, o branco é na medida certa para mim.
 
Iluminando a colorida colcha de fuxico, que cobre o sofá no seu canto preferido da casa, o cabelo de Elisa Ceppas Vianna nunca foi pintado. Ela cresceu vendo e achando bonita a cabeça branca da mãe. Admira as várias nuances que vão do prateado ao branco.
 
— Quando o cabelo fica branco dá luz. Se eu pintasse ia ficar velha. Não curto a velhice mas curto cabelo branco. Chama atenção, é visto como se fosse uma raridade. Uso o meu sempre curtinho porque é fino. Vario o xampu mas dou preferência aos infantis, menos agressivos e com menos soda cáustica — diz Elisinha, que é paisagista.
 
No caso da promoter Lalá Guimarães, a decisão de deixar os cabelos brancos não passou pela moda mas literalmente pela cabeça.
 
— Medito há muitos anos e comecei a ver que essa história estava me pesando. Ao mesmo tempo, passei a perceber mais mulheres de cabelos brancos na rua. Decidi parar de pintar há três meses. No fundo foi um ato de coragem. Uso o xampu adequado, no meu caso, o Osmose, da L’Oréal, que puxa o prateado. Encontrei-me com a Carmen Mayrink Veiga e ela comentou: “Que engraçado, tem tanta gente deixando o cabelo branco que estou me acostumando”. Uma amiga disse: “Você reencarnou de novo!”

 

 

Crédito:Heloisa Marra

Autor:Heloisa Marra

Fonte:O Globo