EMOÇÕES, EU TAMBÉM VIVI...
Houve um tempo em que se namorava realmente
e muito mais intensa e apaixonadamente.
E se pensava
que se sofria muito,
só por amor e só de amor, é claro.
E, as paixões nasciam se acendiam,
embaladas pelas músicas do momento,
que faziam parte integrante,
do dia a dia , de nossas vidas.
E nas festas, que todos nós, íamos nessa época ,
os olhares procuravam e se cruzavam,
enquanto os homens perguntavam
ou diziam para as jovens,
durante os bailes:
"se você quer ser minha namorada,
ai que linda namorada você
poderia ser"...
Aí, o nosso coração se derretia
e era hora de ir ao banheiro
com um amigo, só para contar
o que estava acontecendo...
Uma bebidinha daqui, muitos sorrisos dali,
e na décima vez que tocava o disco
de "Metais em Brasa", de Ray Conniff",
de "Romanticos de Cuba" o ambiente
ficava, cada vez mais, leve e romantico.
E quando se colocava os discos de
Vinicius, de Carlinhos Lyra, de Tom, de Ivan Lins,
e se chegava no trecho "mas se em vez
de minha namorada você quer ser minha amada,
minha amada, mais amada pra valer",
e ela nos olhava de longe,
desta vez dando a entender,
que estava interessada, o nosso coração
só faltava sair pela boca.
E, alguns anos e muitos amores depois,
foi a vez de Roberto e Erasmo Carlos
participar de todos os nossos romances:
"Você foi o maior
dos meus casos, de todos os abraços,
o que eu nunca esqueci"
Ah, e aí surgia uma boa dor-de-cotovelo
ouvindo Roberto e Erasmo.
E quem nunca passou por isso
não sabe o que é viver...nem amar...
E num início de caso , em altíssima voltagem,
entrava Chico com "quero ficar no teu corpo
como tatuagem" e quem não queria?
E, no fim do caso, dava para agüentar
"as marcas de amor dos nossos lençóis"?
Sim, de dia ouviamos muita música e, à noite,
íamos sempre ao mesmo bar,
uma "Fossa" da vida
ou íamos ao Beco das Garrafas,
onde um pianista, como Sergio Mendes, tocava
e, as vêzes,Elis Regina, Dolores Duran,
Maysa, Nara Leão, e tantas outras rainhas
e princesas da noite, cantavam,
com amor, o que tínhamos
ouvido a tarde inteira...
E, como todos se conheciam e sabiam das vidas
uns dos outros, pianistas como Vinhas
e outros nos deliciavam, quase sempre ,
tocando e atacando as "nossas" músicas...
Sim, ouviámos todas elas e, sempre, era tocada
aquela que fazia o nosso coração
bater mais rápido!
E a noite prosseguia com os nossos olhos grudados
na porta da boite, para ver se ela,
a nossa deusa, entrava.
E se ela entrasse sozinha, era hora de disfarçar
e puxar conversa com uma amiga,
só para fazer ciúme.
Sim, éramos ingênuos e infantis...
mas, também, éramos amantes,
romanticos e cavalheiros...
Respirávamos fundo e jurávamos, de pés juntos,
que não íamos nem olhar para o lado dela.
Mas a madrugada se encarregava
de mudar os nossos planos.
Depois, surgiu o "Deixa em paz meu coração,
que ele é um pote até aqui de mágoa".
Sim, as músicas diziam tudo
o que nem sempre tínhamos
coragem de dizer.
Era como se falassem por nós.
E que jovem mulher, ainda adolescente,
nessa época, não cantou baixinho,
depois que seu namorado foi embora,
"quando você me deixou, meu bem,
me disse pra ser feliz e passar bem",
e não fantasiou que quando ele ouvisse
"e tantas águas rolaram,
tantos homens me amaram,
bem mais e melhor que você"
ele não iria, imediatamente, pensar nela...
E quem sabe ele sofreria...
E quem sabe teria uma crise de ciúmes
e pegaria o telefone de madrugada,
para ligar para ela,
declarando o seu grande amor?
Quem sabe... quem sabe?
E quando um de nós se "enrolou" todo com a chegada
de um namorada que não esperava e ficou
repetindo o disco, no trecho que dizia
"se na bagunça do teu coração",
para ver se ela entendia que o coração dele,
às vezes, virava mesmo uma verdadeira bagunça...
Ah, Chico, ah, Roberto, ah, Marcos e Paulo Sergio Valle
e tantos outros, que nos brindaram com músicas
que surgiram do céu, será que vocês algum dia
souberam que tinham sido tão importantes
na nossa vida?
Pois fiquem sabendo: foram.
E nesse tempo as moças não levavam os namorados
para dormir em casa, ou porque tinham pais
ou porque tinham filhos.
Para isso havia os motéis na Barra,
o Dunas , o PlayBoy, o Mayfloyer,
o Hawai , o Kings
e tantos outros que foram palco
de lindas histórias de prazer e de amor.
E da primeira mulher e do primeiro motel
a gente nunca esquece...
A cama redonda com cabeceira de curvin, a piscina,
uma banheira de 2 X 2 , o som embutido na cabeceira
e, sobretudo, o clima, um clima de pecado
e de proibido que as moças da zona sul
e da Turma do Pier, em Ipanema, adoravam.
E, quando Roberto cantava
"Amanhã de manhã vou pedir um café pra nós dois,
te fazer um carinho e depois te envolver
nos meus braços" e ela deixava
"o café esfriando na mesa,
esquecemos de tudo" e vinha o "pensando bem,
amanhã eu não vou trabalhar, e além do mais,
temos tantas razões pra ficar",
não era preciso dizer mais nada...
Era a hora do telefonema da nossa namorada
para a empregada, às 6 da manhã para que ela
desmanchasse a cama e dissesse que ela saiu
cedo para buscar uma amiga no aeroporto, lembra?
Sim, grandes e saudosos tempos que,
infelizmente, acabaram e não voltam mais...
Hoje a gente olha para trás e pensa:
mas esses amores e essas paixões
aconteceram e existiram mesmo?
Sem Chico e sem Roberto/Erasmo
teriam havido tantas,
tão intensas e tão arrebatadoras?
Delas a gente até esqueceu,
mas não do que se sentia
ao ouvir "mas eu estou aqui vivendo
este momento lindo".
E dá para viver momentos lindos hoje,
ouvindo os Racionais MC, os falsos Roqueiros
ou o barulho de metais, de gritos
e de vozes desafinadas
que inundam as rádios e as tvs
sem que exista neles e nelas ,
mais nenhuma poesia e nem romantismo?
Pensando bem, o grande combustível
de nossos corações foram as canções romanticas
da década de 60/70 de Chico, de Tom, de Vinicius,
de Roberto/Erasmo e de tantos outros
que escreviam letras e cantavam as músicas
com suas almas e o coração.
E, olhando para trás, é bem possível que tenhamos
a certeza de que "se chorei ou se sofri,
o importante é que emoções eu vivi"
não existiria sem a música/letra
de Roberto e de Erasmo.
Sim, foi bom demais ter vivido esse tempo.
Pena que não exista uma Ilha da Fantasia
onde pudessémos voltar no passado
para reviver cada um desses momentos,
únicos e mágicos, de nossas vidas...
Pena, mesmo...
Crédito:Luiz Affonso
Autor:Jorge Garcia
Fonte:Universo da Mulher