Rio de Janeiro, 21 de Novembro de 2024

A maneira de dizer as coisas


Uma sábia e conhecida anedota árabe diz que, certa feita, um sultão sonhou que havia perdido todos os dentes.
 
Logo que despertou, mandou chamar um adivinho para que interpretasse seu sonho.
 
Que desgraça, senhor! Exclamou o adivinho.
 
Cada dente caído representa a perda de um parente de vossa majestade.
 
Mas que insolente gritou o sultão, enfurecido.
 
Como te atreves a dizer-me semelhante coisa?
 
Fora daqui!
 
Chamou os guardas e ordenou que lhe dessem cem açoites.
 
Mandou que trouxessem outro adivinho e lhe contou sobre o sonho.
Este, após ouvir o sultão com atenção, disse-lhe:
 
Excelso senhor! Grande felicidade vos está reservada.
O sonho significa que haveis de sobreviver a todos os vossos parentes.
 
A fisionomia do sultão iluminou-se num sorriso, e ele mandou dar cem moedas de ouro ao segundo adivinho.
 
E quando este saía do palácio, um dos cortesãos lhe disse admirado:
 
Não é possível! A interpretação que você Fez foi a mesma que o seu colega havia feito.
Não entendo porque ao primeiro ele pagou com cem açoites e a você com cem moedas de ouro.
 
Lembra-te meu amigo - respondeu o adivinho - que tudo depende da maneira de dizer...
 
Um dos grandes desafios da humanidade é aprender a arte de comunicar-se.
 
Da comunicação depende, muitas vezes, a felicidade ou a desgraça, a paz ou a guerra.
 
Que a verdade deve ser dita em qualquer situação, não resta dúvida.
Mas a forma com que Ela é comunicada é que tem provocado, em alguns casos, grandes problemas.
 
A verdade pode ser comparada a uma pedra preciosa.
Se a lançarmos no rosto de alguém pode ferir, provocando dor e revolta.
Mas se a envolvemos em delicada embalagem e a oferecemos com ternura, certamente será aceita com facilidade.
 
Os não ditos...
 
As palavras às vezes cortam como uma faca e de maneira irrefletida ferimos os outros, mesmo se os amamos, sem que haja retorno.
 
Conscientes disso é que em muitos dos casos, nos calamos, quando tudo o que pensamos e sentimos nos queima por dentro.
 
Essas coisas são os não ditos das relações e da vida.
As palavras que não dizemos, mas não enterramos também, estão sempre entre nosso coração e nossa garganta e nos ferem interiormente.
 
São opções que fazemos, seja para não machucar outras pessoas, seja, simplesmente, pela falta de coragem de sermos nós, inteiros e límpidos.
 
A comunicação é a base de todo relacionamento saudável. Pessoas que se amam, que seja na amizade, no amor ou nas relações familiares, devem estar prontas para serem quem são, para perdoar e receber perdão.
Não nos calaríamos tanto se soubéssemos que o outro nos ouviria com a alma, nos entenderia e continuaria a nos amar, apesar de tudo.
 
Mas as pessoas, por mais maduras que pareçam, nem sempre estão prontas para ouvir as verdades, se essas forem doloridas.
 
Assim são criadas as relações superficiais, onde pensamos tanto e falamos de menos, onde sentimos e sufocamos.
 
Nos falta um pouco de humildade para aceitar nossa imperfeição, aceitar que o outro possa não gostar de algo em nós e ter o direito de dizê-lo.
 
Nos falta a ousadia de sermos nós, sem essa máscara que nos torna bonitos por fora e doentes por dentro.
 
A comunicação na boa hora, com as palavras escolhidas e certas, consertaria muitos relacionamentos, sararia muitas almas, tornaria as pessoas mais verdadeiras e mais bonitas.
Sabemos que as pessoas nos amam quando nos conhecem profundamente, intimamente e continuam nos amando.
 
Quando com elas temos a liberdade e coragem de dizer: isso eu sinto, isso eu sou.
 
(Letícia Thompson)
 
 
 

Crédito:Luiz Affonso

Autor:Letícia Thompson

Fonte:Universo da Mulher