Gabeira sempre foi um verde ligado a questões ambientais, reinventando a estética das campanhas políticas com flores, cores, performances, arte e a exaltação do prazer em ambiente de paz e amor. No lugar de tradicionais passeatas e comícios raivosos e sisudos. Idealismo enriquecido, fruto da reflexão e conhecimento, ao conduzir o metrô de Estocolmo.
Depois de banido do Brasil ao participar do seqüestro do embaixador americano nos anos de chumbo. Retornou de pára-quedas no Posto 9 de tanga de crochê, anunciando o crepúsculo do macho no contexto de uma vida alternativa, apontando novos horizontes e colocando na berlinda conceitos de companheiros da esquerda, hóspedes da utopia que pretendiam inaugurar uma nova Entradas e Bandeiras.
Gabeira sempre se portou como um gentleman, ao falar em outro idioma com governos incapazes de entender os tempos modernos, pautados pela ótica dos critérios de produção e distribuição de bens materiais. Sem se acautelar com os riscos de alimentos transgênicos. Sem se preocupar com a poluição decorrente da importação de pneus usados ou com a contaminação das usinas de Angra. Sem falsos pudores, a pá de cal no acesso aos documentos históricos do país, obstruindo indenizações por conta de excessos da ditadura militar.
O que vai de encontro à imagem de doidão plasmada no curso de campanhas para legalizar a maconha ou descriminalizar a prostituição, reconhecendo a profissão mais antiga do mundo como prestação de serviços sexuais. Quando, na verdade, pretende escapar de um museu atrelado a novidades, cuja visão do futuro se perdeu num produtivismo estreito sem a compreensão das variáveis ecológicas, gerado por interesses do grande capital que roda a bolsinha nas alamedas da Bolsa de Valores.
Aos 76 anos, Gabeira ainda sonha, imbuído de quimeras que embalam paixões e detonam cínicos que só pensam com a mão no bolso. Emudece sarcásticos que desdenham de ilusões por motivarem paixonites que não levam a nada, pensando tratar-se de fantasia da imaginação ou promessa vã de felicidade.
Há um conceito em voga que se exige a quem amadureça, como reflexo, que se viva menos, com mais reservas, para evitar os problemas decorrentes da inconseqüência e amadorismo da juventude, que tenta pôr a vida na roda para brincar de cabra-cega. Num mecanismo de defesa para evitar a possibilidade de sentir o amor em toda a extensão, desde o delirar até o dilacerar. Ser maduro não é sofrer com o amor, não é amar com aquela intensidade que arrebenta. Temos direito a amar de forma cega apenas uma vez, senão corre-se o risco de repetir e banalizar sentimento tão nobre. Aliás, o ideal é não se apaixonar, ao se enxergar a inutilidade da entrega incondicional, à mercê de outrem que não alcança a sua sensibilidade.
Gabeira é o próprio ponto de mutação.
Antonio Carlos Gaio
Crédito:Antonio Carlos Gaio
Autor:Antonio Carlos Gaio
Fonte:Universo da Mulher