Rio de Janeiro, 03 de Maio de 2024

Moda ou atitude?

Moda ou atitude?
Marcar o corpo com um desenho escolhido a dedo é um tipo de ‘personalização’ que atrai cada vez mais gente. Sensual, moderna ou expressão de uma simbologia pessoal, a tatuagem saiu dos guetos, dos presídios, portos, palcos e encontros de amantes de Harley Davidson para entrar na vida cotidiana, enfeitando braços e pernas de gente comum e até de nobres, como o príncipe Frederik da Dinamarca.
 

Hoje, são as mulheres que usam e abusam dessa arte. Elas perderam a timidez e vão além das discretas borboletas ou estrelinhas do passado, ostentando grandes tatuagens tribais, com flores, símbolos ou o que mais inventarem. E não só o tamanho aumentou, mas também a quantidade de desenhos.

Isso é o que diz o tatuador Leds (Sérgio Maciel), um dos mais requisitados de São Paulo, que chega a receber 150 clientes aos sábados. “Quando abri meu estúdio, há 20 anos, pouquíssimas mulheres vinham fazer tatuagem. Agora, mais da metade da minha clientela é do sexo feminino. São 55% de mulheres para 45% de homens.”

O caso da decoradora Silvia Regina Lemos Belforti Bevilácqua, uma de suas clientes, é um bom exemplo da perda do preconceito. Ela está com 45 anos e tem nada menos que dez tatuagens ou “tatoos”, como são chamadas.

Entre a primeira e a décima, passou-se apenas um ano da vida de Regina. “Antes, tatuagem para mim era sinônimo de algo sujo, fazia parte da marginalidade. Mas depois que meu marido fez a primeira, comecei a me interessar.”

Ela foi a uma feira sobre o assunto, visitou o estúdio do tatuador Leds e descobriu que “as pessoas que faziam tatuagens eram normais”. Empolgada, fez um sol nas costas e sentiu o gosto do sucesso: “Começaram a me parar na rua para perguntar onde eu tinha feito. Todo mundo achou sensual”.

Com a aceitação geral, Sílvia fez mais nove, que ornamentam seu braço, pé, tornozelo, pescoço, punhos, mão e seio, todas pretas – “Só a do pé doeu um pouco.” Sua idéia , agora, é fazer a 11ª no pescoço, colorida. Ela acredita na superstição de que não se pode ter tatuagens em número par.

De seus três filhos, dois usam piercings e o mais novo, de 17 anos, quer também se tatuar. Mas a mãe quer que ele espere a maioridade. O marido, pivô de tudo, só agora está partindo para a segunda: vai cobrir as costas. “Ele é engenheiro, dá palestras, só pode fazer tatuagens em locais discretos.”

 

TATOO X EMPREGABILIDADE –

Os especialistas em Recursos Humanos aconselham cautela. A presidente do Grupo Foco, que seleciona profissionais para multinacionais, Eline Kullock, diz que ainda há preconceito no mercado de trabalho: “Quem quer seguir carreira, deve analisar o perfil da empresa antes de fazer uma tatuagem. Os bancos, por exemplo, são mais conservadores. As empresas de comunicação têm uma postura mais aberta.”

Vale salientar, no entanto, que o conceito de tradição e modernidade varia de região para região. O Grupo Foco tem filiais em todo País e Eline conta que em Joinvile (SC) já cancelaram a contratação de um soldador, porque viram na última hora que o candidato tinha uma tatoo. “Lá, as empresas são familiares e de origem alemã. Para eles, a pessoa tatuada não é séria, não pensa no futuro.”

Na capital carioca, a postura é diferente: “A tatuagem é vista como sinal de modernidade e sensualidade. São Paulo fica no meio-termo, apesar do interior mais conservador”.

A modelo Barbara Koboldt, de 27 anos, já viveu o preconceito na pele. Gaúcha, ela perdeu alguns trabalhos em Porto Alegre por causa de suas nove tatuagens. “Eu era vista como maconheira”, lembra.

Depois que mudou para a capital paulista, e – registre-se – que as tatoos entraram para o mundo da moda, seus desenhos espalhados pelo corpo se transformaram em chamariz e marca registrada. “Hoje tenho trabalho por causa delas. E quando não querem que elas apareçam, cobrem todas com maquiagem ou limpam no photoshop”, vangloria-se.

APELO SENSUAL –

Para os homens, em geral, a tatuagem estampada no corpo feminino é considerada sexy. Para algumas mulheres, funciona tal e qual um fetiche.

A estudante de geografia e surfista Bibiana Kumpera, 26 anos, diz que homens com várias tatuagens a atraem mais. Ela própria fez sua primeira tatoo aos 15 anos, um discreto tubarãozinho do lado de dentro da canela. Para realizar seu desejo, precisou e conseguiu a autorização, por escrito, dos pais.

Depois de três anos, veio a segunda, nas costas: um hibisco colorido, cujo desenho ela guardou durante muito tempo. Mas seu tamanho ainda era reduzido. Mas Bibiana queria algo maior e, aos 20 anos, marcou a pele com um grande pássaro tribal, na parte inferior das costas.

A metragem avantajada da tatoo, entretanto, não agradou seus pais. “Minha mãe se sentiu ofendida, achou que era grande demais”, lembra. Em compensação, seu namorado daquela época gostou tanto que começou a pensar em tatuar-se também.

 

A TATOO E SEUS CUIDADOS

 – Primeiro ponto: quer fazer tatoos? Vá a um estúdio recomendado e, de preferência, conheça o trabalho do tatuador antes de passar pela ação de sua agulha. Lembre-se: a assepsia é essencial, portanto, devem ser usadas agulhas descartáveis e equipamentos esterelizados.

A dermatologista Maria Adélia de Freitas Dias adiciona à lista do tatuador Leds outro cuidado: observar se as tintas usadas são atóxicas – “existem pigmentos mais agressivos, que provocam reações alérgicas e podem causar inflamação e até deformação do desenho em casos mais graves”.

Por quinze dias, tempo para cicatrização, o recém-tatuado não deve entrar em piscina ou mar. Depois, o único cuidado permanente é evitar o sol (que desbota a tatoo) e, se possível, hidratar o local diariamente. Leds aconselha o uso permanente de bloqueador solar número 45.

Quem tem tendência à quelóide também deve evitar tatoos: pode-se formar uma crosta e ficar até cicatriz. Em casos extremos, a única solução é tirar o pigmento causador da alergia, através de raspagem, a chamada dermatoabrasão.

Esse mesmo método pode ser usado por quem se arrepende do desenho tatuado, mas geralmente deixa marcas. O processo mais moderno de remoção é o laser rubi. Contudo, segundo a dermatologista, ele também não consegue tirar tonalidades como o vermelho e o amarelo, embora seja eficiente com tatuagens pretas.

Apesar dos métodos de remoção, o mais prudente é pensar que uma tatuagem á para toda vida. Assim, o legal é testar o desenho primeiro com hena, que sai rapidinho.

Quanto à dor, Leds explica que tatuar locais com mais ramificações nervosas, como costelas, pés e seios, pode doer mais. Só que não tem jeito, a anestesia é proibida por causa do inchaço da pele, que pode prejudicar o trabalho.

E quando passar a moda ou a velhice chegar?

Responde o tatuador: “Tem conserto. É só refazer o desenho.” Retocar, aliás, sempre é legal quando o sol causa algum estrago.

Crédito:Anna Beth

Autor:Fabiana Caso

Fonte:O Estadão