Rio de Janeiro, 18 de Maio de 2024

Experiência traumática

Acabei de ter uma experiência traumática numa maternidade portuguesa e gostaria de dividir com vocês um artigo que escrevi e estou repassando a todos as instituições interessadas no argumento maternidade.
 
por Rosana Antonio

 
Qual é o sentido da maternidade para as Maternidades?
 
Foi a primeira pergunta que me fiz ao entrar na Maternidade Alfredo da Costa (MAC) no dia 05 de Junho de 2009.
 
Minha bolsa se rompeu em casa as 20h do dia 05 de Junho.
 
Tranquilamente liguei para o meu marido que estava a uma hora e meia de Lisboa, por isso achou melhor que um amigo me levasse logo para a maternidade. Às 20h30 fui atendida pela enfermeira de plantão daquele dia. Eu tinha sonhado com esse dia, esperava algo do tipo: “Olá, então chegou a hora?”
 
Mas na verdade fui recebida com um: “Dispa-se e deite-se.”
 
A Srª Enfermeira pediu também as minhas análises e com elas se abanava o tempo todo do calor que sentia. Pediu também o livro verde e com ele aberto também se abanou. Parecia sentir muito calor. Viu aquilo calada e perguntou: “O pai do bebé é conhecido?” Pensei: “Pra quem?” Mas respondi: “Sim.” Ela continuou as perguntas... “É branco?” Eu, sem entender disse: “Como?” Ela continuou... “É branco?, cigano?, indiano? africano?”
 
Respondi: “Branco.” No mesmo instante, entra uma colega, que também parecia não estar bem humorada, dizendo: “E agora, o que ela fez com a escurinha?” A Sª Enfermeira que me atendia lançou mais um comentário xenófobo: “Sei lá, parece que foi lá falar com ela. Esta ai é mesmo a boa samaritana.” As duas protestavam a gentileza e a amabilidade da recepcionista com as grávidas da vez, naquele dia.
 
A colega ficou ali falando com a Srª Enfermeira, que já estava me atendendo. E esta, quando me vê despida, vem e faz o toque. Não foi um toque normal, de dor, comecei a fazer a respiração já indicada nas visitas mensais. A Srª Enfermeira, enfurecida, me diz:
 
“Oh filha, respira para a parede, não tenho eu que apanhar com isso!” Pedi desculpas e continuei a respirar para suportar a dor. Quando ela terminou, desceram uns dois litros de água pelo chão. Ela diz-me: “Levanta-te e comece a caminhar até chamarem-na para o quarto.”
 
E gritou: “Auxiliare, venha limpar mais uma porcaria. Eu achei tudo muito macabro, mas estava feliz. A Leticia estava chegando. Olhei para a Srª Auxiliar e disse: “desculpa.” Em seguida, fui toda contente caminhar pelos corredores.
 
Meu marido vinha de Santo Tirso e minha mãe de Ericeira. Ela acompanharia o parto, conforme autorização da maternidade. Uns 20 minutos depois chamaram-me para o quarto 6. Minha mãe chegou meia-hora depois, o que me deixou muito mais tranquila.
 
Estivemos ali, ela a consolar-me pelos toques que faziam de hora em hora, mas nenhum deles, foi como o da Srª Enfermeira que me recebeu. Eu a perder água sem parar, e nada de dilatação, mas tinha um consolo, duas enfermeiras que pareciam não fazer parte do grupo ou da maternidade que foram super gentis, a Amélia e a Sónia. Chegavam, faziam um toque nada violento como o primeiro, e diziam:
 
“Vamos Rosana, queremos fazer o seu parto. E será aqui mesmo neste quarto que a Leticia vai nascer.”
 
No dia seguinte, a dilatação continuava muito lenta e então iniciaram a prática para induzir as tais contracções. Elas começaram logo, mas a dilatação era lenta. Avisavam-me sempre dos centímetros que aumentavam e ao quinto ou sexto chega a médica que fez a epidural. Por cinco minutos não senti mais as dores. Bom demais para ser verdade.
 
Pois é.
 
Em seguida, comecei a sentir uma dor fortíssima do lado direito mesmo no “pé da barriga”.
 
Depois de sentir a tal dor mais umas duas horas, volta a Srª Drª Anestesista. Pois ela se apercebeu que tinha ficado “uma ‘janela’ aberta” foi esta a sua expressão.
 
E mais: que não poderia mais mexer na minha coluna. Bem, fiquei ali com esta tal “janela aberta” que mais parecia a “boca do diabo”. Aos 10 cm de dilatação, quase 24 horas e sem mais forças para ter minha filha, entra a Srª Dra.
 
Graça e uma grande equipa. A mesma que passava por lá a cada hora para fazer o toque. Depois de muitos esforços a Srª Dra. Graça percebeu que o parto não poderia ser normal. Então começou a falar com a equipa sobre um parto a “ventosa”.
 
Eu, preocupada, perguntei a minha mãe o que era este parto. Ela, também sem saber, virou-se para a Srª Dª Graça e perguntou o que era o parto a ventosa, a Srª Dª Graça não quis dar nenhuma explicação a minha mãe dizendo que sabia o que estava fazendo. Minha mãe insistiu, dizendo que precisava avisar ao pai da criança.
 
Naquele momento, a Srª Dª Graça pediu que acompanhassem minha mãe a recepção e que me levassem para a sala operatória.
 
No elevador, escuto os comentários e a ira da Srª Dra. Graça, que dizia: “Como assim, falar com o marido. Se quisessem explicações médicas, deveriam ter ido para uma clínica privada. Sei eu o que eu faço, não devo dar explicações.”
 
Achei o comentário desprezível, ainda mais tratando-se da “melhor maternidade do país”. Eu, tentando ser simpática, em meio as tantas dores e preocupada com o humor da Srª Dra. Graça, que iria fazer meu parto, disse: “Srª Dra. Graça, minha mãe teve uma péssima experiência com forceps, é só isso. E o que ela pretendia era entender que processo é este que vão usar comigo.”
 
Ela não quis saber. Entramos na sala e a mesma Srª Dra. anestesista me fez mais uma dose no cateter. No mesmo instante, a Srª Dª Graça começou a discutir com a colega se fazia a ventosa ou a cesariana. Uma dizia que não seria possível fazer mais a cesariana, outra dizia para fazer a ventosa. Eu, em pânico, disse: “Mas me parece que vocês não estão de acordo.”
 
Bem, esta minha frase deixou a Srª Dra. Graça e a Srª Dra. anestesista furiosas. Esta última disse que não ficava mais ali e a Srª Dra. Graça disse que a vontade que tinha, era de não fazer o parto. Bem, ficaram ali discutindo o tempo todo. A Srª Dra. Graça se sentia ofendida e não conseguiu esconder. Perdeu mais uma vez o controlo e, quando retirou a Leticia, disse: “Berra Leticia, se não a sua mãe vai fazer queixas de nós.” Olhei para minha filhinha tão linda e indefesa e pensei: “Meus Deus, como pode uma médica dizer a uma criança para berrar.”
 
Vivi em quatro países antes de Portugal, e em nenhum deles as crianças berram. Esta expressão é usada para referir-se aos animais.
 
Mas parece que, para a Srª Dra. Graça, é também usada para as crianças, em Portugal. Em siléncio, pedi desculpas para minha filhinha e pedi que ela aguentasse firme e que muito em breve sairíamos daquele lugar macabro. Depois de retirarem a Leticia, se depararam com mais um problema.
 
A placenta não se descolava. Em meio a tanta perda de sangue comecei a ter uma crise cianótica, mas me mantive lúcida e acordada, escutando o chorinho da minha filha. A Srª Dra. Graça tentava arrancar a placenta com toda sua força e com as unhas encravadas em minha barriga.
 
A cada minuto perguntava se me fazia mal e eu sempre dizia que sentia as suas unhas. Aguentei ainda uns 30 minutos, que me pareceram longos, para a retirada da placenta. A Srª Dra. Graça jogou a placenta em cima de uma mesa ao meu lado. Fiquei com uma sensação estranhíssima, como a de estar fazendo parte de um abate de vacas, já que a própria Srª Dra. Graça pediu que minha Leticia berrasse. Terminando sua função, a Srª Dra. Graça pediu a sua auxiliar que me fizesse os pontos.
 
Para a minha sorte, vi um rosto conhecido. Tratava-se da Dra. Rita. Era uma jovem médica que dias antes tinha me atendido na primeira consulta na MAC.
 
Ela também me reconheceu e, diferente da Srª Dra. Graça, ela fez seu trabalho em silêncio e, quando terminou me disse: “Rosana, ficou muito bom. Você vai ficar bem logo. Muitas felicidades!”
 
Em meio aos demónios existem sempre alguns anjos. Ainda bem! Minhas visitas mensais na gravidez foram acompanhadas no posto de saúde de São João.
 
Foi uma opção minha e do meu marido, depois de termos tido algumas experiências no privado que não justificava tal despesa. O profissionalismo da Dra. Ilda, da Enfermeira Cidália e toda a equipa de trabalho dali tinha nos cativado de uma certa maneira, que cheguei a dar uma entrevista para um telejornal sobre a qualidade dos serviços públicos de saúde em Portugal.
 
Eis o porque da minha surpresa na MAC, considerada a melhor do país. Eu, em meio a discussão, desequilíbrio e falta de postura da Srª Dra. Graça, que de graça tem pouco, cheguei a repetir isso: “Que a MAC era conhecida como a melhor maternidade do país. Pois é. Como será a pior. E, para já, deixo a pergunta: Qual o sentido da maternidade para as maternidades???
 
 
Meus sinceros agradecimentos.
 
 
 
Rosana Antonio
 
 

Crédito:Cris Padilha

Autor:Rosana Antonio

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