Rio de Janeiro, 17 de Maio de 2024

A Cara do Rio

O Rio de Janeiro não merece mais ficar refém do gênero de político fisiológico que tomou conta desta infeliz cidade, coisas do gênero Picciani e toda a malta do bordel em que se transformou o PMDB, um partido que há muito deveria ter se dissolvido e que ainda hoje sobrevive da mística de sua história de luta contra a ditadura, embora há muito se tenha tornado o contrário: o abrigo dos oportunistas de sempre que apoiaram e mesmo capitanearam o regime militar, vide José Sarney; até todo tipo de aproveitadores e negocistas desta infeliz República.
 
Durante muito tempo falamos e falei mal do PFL (hoje DEM), deixei de votar em candidatos como FHC e Serra devido à aliança do PSDB com o ex-PFL, um partido que definia como incapaz de viver à margem do governo e que se incorporava à situação, qualquer que fosse a orientação desta, invertendo assim o mote anarquista: “hay gobierno, soy a favor!”.
 
Na verdade hoje o DEM vive na oposição, não melhorou em relação ao antigo PFL, mas apenas tornou-se mais claro, mais definido.
 
É o PMDB que não consegue viver longe do poder, de qualquer poder. Suas alianças e quadros, pelo menos em nossa infeliz cidade, são o que há de mais atrasado e venal.
 
 
Os demais partidos da base de sustentação da candidatura apoiada por Sergio Cabral, o filho, formam uma salada (aparentemente) difícil de entender.
 
 
Senão vejamos: o candidato Eduardo Paes, em seu comício de encerramento, tinha em seu carro/palanque lado a lado as figuras de Francisco Dornelles (um autêntico e fiel servidor da ditadura), que detêm o monopólio carioca do PP, partido oriundo (até mais que o DEM) da antiga ARENA, e hoje abrigando figuras luminares da política como Paulo Salim Maluf e, a seu lado, Jandira Feghali, a musa (melhor seria dizer a coisa) do PC do B, esse estranho organismo político que até a queda do Muro de Berlim tinha Albânia como o verdadeiro “paraíso e farol do socialismo”, um partido liderado por uma figura, como o falecido João Amazonas que com fala mansa e idéias tortas mandou dezenas de jovens para a morte no Araguaia, enquanto se mantinha prudentemente à distância. 
 
Havia também na passeata a representação do MR-8, uma coisa esquisita que começou “revolucionária” e terminou no colo do Quércia; a Igreja (?) Universal do Reino de Deus (ah, se Jeová ainda estivesse presente para tomar medidas contra o uso indevido do seu santo nome!), misturada à Opus Dei (idem), ao PT fluminense (sem comentários) e ao que há de mais atrasado e pelego no PDT.
 
Tudo isso para lutar contra um candidato que é descrito por eles, em repugnantes e covardes panfletos apócrifos, como incentivador da prostituição, consumidor de drogas, de sexualidade duvidosa e desconhecedor dos problemas do Rio.
 
Esse candidato trouxe um sopro de ar novo e fresco à política do Rio. Há muito tempo não ouvimos alguém tão civilizado, tão do jeito de que esta cidade gosta de se ver e de ser vista.
 
 
Enquanto o candidato de Cabral, o filho, apresenta promessas de UPAS e valorização das carreiras de servidor, tentando mostrar que conhece profundamente a cidade, os servidores do Estado governado por seu padrinho, foram proibidos de protestar ante a casa do Cabralzinho por um grande aparato policial. Eduardo Paes vive denunciando o mau funcionamento dos hospitais municipais e prometendo o paraíso. 
 
Basta olhar para os hospitais estaduais, que o Filho do Cabral também prometia tornar modelares, para ver no que resultam essas promessas.
 
Nos hospitais estaduais falta até água, como ocorreu recentemente com o Pedro II, ou os “vagabundos” (qualificativo do Cabral Mirim para esses profissionais, contratados por cooperativas fajutas cujos donos enchem a burra e certamente dividem, não com os “cooperativados”...) que faltam aos plantões por absoluta falta de condições de trabalho.
 
Não se trata de defender Cesar Maia, o nosso enlouquecido alcaide que entregou a cidade à própria sorte e que apóia o candidato renovador única e exclusivamente por falta de qualquer opção política, mas daí a escolher como opção o itinerante Cabralzinho e sua política genocida de segurança, que transformou grandes áreas da cidade em territórios de guerra, com dezenas de mortos; que gasta exatos R$ 2 milhões 997 mil para montar um posto de atendimento de lata (em contêineres), a UPA, exatamente quatro vezes o custo de construção de um posto de saúde convencional e mais sete milhões anuais para funcionar, sem que os médicos tenham condições e salários dignos e que já repetem o mesmo quadro da rede existente no resto da rede criticada: filas e mau atendimento.
 
Como funcionam os hospitais estaduais?
E as escolas do Estado?
 
 
Cabralzinho prometeu muito, mas perguntem aos funcionários. Aliás, seria bom que os meios de comunicação anotassem as promessas e bravatas desses candidatos que conhecem tão bem a cidade e ano após ano deixam tudo na mesma ou pior.
 
Seria o caso e a cada ano de mandato fazer um balanço e mostrar ao povo o que foi ou não cumprido. Aposto que vai ser muito ilustrativo... (observação: Vale também para o candidato Gabeira).
 
Gabeira não tem experiência administrativa diz o candidato do filho do Cabralzão, uma acusação que também acompanha outro candidato, mais global, Barak Obama, e que também foi feita contra o Molusco, em sua odisséia para chegar à presidência.
 
 
Pode-se até não gostar dele, por vários motivos (os meus caminham todos pela esquerda traída), mas é inegável que Luiz Inácio não poderá ser acusado de inexperiente, por ter dado nó em pingo d’água em muitas raposas cheias de experiência.
 
Gabeira é inteligente, culto, cosmopolita, tem uma visão global, história pessoal e política sem nada que o desabone e suas idéias e modo de agir me parecem algo que devemos experimentar na cidade.
 
 
O prefeito não precisa conhecer todas as ruas da cidade, nem saber de cor e salteado os números de todas as posturas municipais.
 
Muito mais importantes são a postura civilizada e uma visão ampla do papel do Rio, da vocação da cidade, algo que perdemos desde que a Capital saiu daqui e mais acentuadamente desde que nos fundimos (há quem prefira outro verbo) quando herdamos o Estado do Rio.
 
 
E não venham com o argumento anti-republicano de que para obter os recursos a que tem direito o prefeito do Rio precisa afinar-se politicamente (leia-se abaixar as calças) para o governador do Estado e o presidente da República.
 
 
Ao pagar impostos o fazemos a qualquer governo, gostemos dele ou não e a recíproca deve ser verdadeira. Se isso não ocorrer o cidadão tem o direito e mais do que isso o dever da desobediência civil, “se o governo me descrimina por causa de meu voto, farei o mesmo com o meu imposto”.
É por isso e muitas outras razões que vou votar em Fernando Gabeira neste domingo.
 
 
 
PS. Se eu fosse candidato a prefeito no Rio, lançava como programa a autonomia da chamada Zona Oeste, (Campo Grande, Santa Cruz, Sepetiba...).
 
Me candidataria propondo-me a ser o último prefeito carioca daquelas localidades que há anos vem, com razão, pleiteando o status de cidade.
 
É uma região completamente diferente do Rio tradicional e por sua distância costuma ser alvo e reduto do que existe de pior na política da cidade, vivendo abandonada, sem infra-estrutura e esperança.
 
Talvez autônoma essa região acabe encontrando o seu justo e merecido desenvolvimento, deixando de ser um curral eleitoral do atraso.
 
O Rio precisa diminuir de tamanho.
 
Grandes cidades como Londres já fizeram isso, fracionando a área urbana em vários municípios.
 
O Rio que conhecemos é a Zona Sul, Zona Norte e o subúrbio que segue os caminhos do samba, até Madureira e vizinhança.   
 

 
Montbläät - Um Jornal Para Entender o Brasil
Rio de Janeiro, 24 a 31 de outubro de 2008
Edição 308 - Ano V

Crédito:Luiz Affonso

Autor:Fritz Utzeri

Fonte:www.montblaat.com.br