Rio de Janeiro, 17 de Maio de 2024

Brasil espremido entre duas mediocridades

Uma equação com o mesmo “X”
 
 
Confesso que o mundo das pesquisas de opinião às vezes agride o bom senso, mas quem disse que o bom senso é um critério válido nesta Pindorama?
 
 
Ontem, o Datafolha divulgou uma pesquisa entre os eleitores sobre as características que diferenciam e caracterizam os candidatos à presidência da República.
 
Entre os eleitores que responderam à pesquisa eleitoral, após o debate, e que ampliaram a margem da vitória do candidato do NeoPT, chama a atenção um detalhe: Alckmin é visto como “mais inteligente” por 51% dos pesquisados, contra apenas 31% que atribuem essa característica a Luiz Inácio.
 
 
O Tucano é visto como “o mais moderno e inovador” por 45% contra 39% que enxergam a modernidade no atual presidente, mas em compensação Luiz Inácio é mais “simpático” (47% a 40%), isso apesar de uma parte considerável dos eleitores – 37% - acharem que ele é o que “mais faz promessas que não pode cumprir”, (contra 32% a seu adversário).
 
 
O neopetista é percebido como “mais democrático” e o tucano como mais “autoritário”, mas há detalhes engraçados: Luiz Inácio é considerado o “mais corrupto” por 35% dos pesquisados e ganha no quesito, mas, ao mesmo tempo, é apontado como o “mais honesto” por 34% e ganha igualmente neste item, o que indica forte polarização e um empate técnico. O Brasil não consegue decidir direito quem é honesto e quem é ladrão nessa disputa.
O terço restante já fundiu a cuca.
 
 
Mas há dois itens percebidos claramente: Luiz Inácio é visto como aquele que “mais defenderá os pobres” por 62% dos pesquisados, enquanto a Alckmin é atribuída a “defesa dos ricos” por 59%. Essa idéia resulta dos chamados “programas sociais” como o Bolsa Família e do jeito “gente como a gente” do presidente.
Os programas sociais conseguiram atrair uma massa imensa de eleitores para o candidato do NeoPT, eleitores que não votaram nele há quatro anos.
 
Naquela ocasião, muitos pobres diziam que não votariam em Luiz Inácio porque “não estava preparado”, em geral comparando-se a ele e indicando auto-estima baixa. Hoje, a situação é diferente. Os R$ 65,00 de ajuda mensal, se transformaram num ganho de renda considerável para quem está abaixo da linha da pobreza.
 
 
Some-se a isso a estabilidade de preços e a queda do preço da cesta-básica, mais o aumento do mínimo (ajudado pela – artificial – cotação baixa do dólar), para entender que a massa de eleitores do Molusco é bem consolidada. O problema dessas “bondades” é que a conta vem sempre depois, já vimos esse filme algumas vezes).
 
 
O que Luiz Inácio esconde é o pai de suas crianças. Longe de mim defender FHC. Durante seus oito anos de principado não fiz outra coisa senão criticá-lo e jamais votei nele, devido à sua aliança como o PFL.
Mas vejam só o texto que segue, que rasguei discretamente e embolsei de uma revista num consultório médico (os destaques são do texto):
“Qualquer governo tem dificuldade para atender diretamente às famílias, mas os governos anteriores ao atual não deram tanta importância ao trabalho da Pastoral (da Criança). Eu chegava a esperar dois, três dias para ser atendida e ouvida. Isso mudou. Posso dizer que, nesses últimos anos, a Pastoral vem sentindo muito mais apoio.
 
 
Esse governo tem dado mais importância e atenção às organizações não-governamentais. Entendeu que o dinheiro público não é do governo, é do povo. O governo deve administrá-lo bem. Vejo o governo utilizar melhor os seus recursos. As cestas básicas, por exemplo, eram instrumento político, sou testemunha disso: certa vez um deputado me disse: ‘Se eu conseguir cesta básica por três meses, estou eleito’. Mas hoje não se escuta mais isso.
 
 
Há um novo modelo de gestão do dinheiro público sendo posto em prática, eliminando intermediários desnecessários e fazendo os recursos do governo chegarem direto na mão de quem realmente precisa deles”.
 
 
O depoimento é de alguém acima da mínima suspeita, Dona Zilda Arns, irmã de D. Paulo Evaristo Arns, cardeal emérito de São Paulo e a principal figura da Pastoral da Criança. A revista, velha (já viram consultório médico com alguma revista nova?) é uma Marie Claire e a propaganda é do governo passado. Retirei apenas um número do texto acima para impedir a identificação imediata. Na frase: “...nesses últimos anos, a Pastoral...”, leia-se:  “...nesses últimos oito anos, a Pastoral...”, perceberam? (O grifo é meu).
 
 
A política econômica também não mudou. De Armínio Fraga a Henrique Meirelles, a chave do cofre permanece firme em mãos banqueiras, que praticam a mesma política ortodoxa implantada no governo do Grão-Tucano e que continuou a valer durante todo o governo atual. Convém lembrar que o DNA de Meirelles o classifica como um Ramphastos monolis, pássaro característico, com bico grande e colorido que tem entre os seus hábitos o de pilhar ninhos alheios, em resumo, um tucano. Meirelles tinha acabado de eleger-se deputado federal por Goiás (em campanha milionária) pelo PSDB, quando foi convidado pelo Molusco.
 
 
O Globo noticiou assim: “Depois de idas e vindas, o presidente eleito Luiz Inácio Lula da Silva anunciou ontem que o deputado federal eleito pelo PSDB de Goiás, Henrique Meirelles, ex-presidente mundial do BankBoston, será o presidente do Banco Central. Lula chamou o banqueiro tucano de companheiro ao fazer o anúncio na Granja do Torto. ‘Estou voltando ao meu habitat natural, que é o mercado financeiro’, disse Meirelles.
 
 
O presidente do PSDB, José Aníbal, disse que Meirelles terá que se desligar do partido. O ministro Pedro Malan e o presidente do BC, Armínio Fraga, elogiaram a escolha, criticada por petistas. A indicação de Meirelles não foi suficiente para acalmar o mercado. Impulsionado pelo vencimento de dívidas, o dólar que estava em queda acabou fechando o dia com alta de 1,46%, cotado a 3,79, após o anúncio. Em relatório divulgado ontem, o ABN Amro disse que Palocci prometeu nos EUA aumentar o superávit primário” (o grifo é meu).
 
 
Por falar nisso, que fim levaram os processos contra Meirelles, que obrigaram o Molusco a “blindá-lo”, dando-lhe o status de ministro?
De todos os acusados com pasta, apenas Meirelles continua impávido colosso nesta pátria amada, salve-salve. Por que será?
 
 
Luiz Inácio teve mais sorte internacionalmente do que FHC.
Ao contrário do que ocorreu no final da década passada, não ocorreram grandes crises na economia nos últimos quatro anos, houve um momento de grande expansão que não soubemos aproveitar. Esse panorama pode até ter sido conseqüência da guerra do Iraque que já matou mais de 600 mil iraquianos, e custou – até aqui – mais de 600 bilhões de dólares aos norte-americanos. O preço de cada iraquiano morto é de um milhão de dólares, uma simetria perfeita com o que aconteceu no Vietnã. Imaginem o que esse dinheiro bem aplicado não faria a um país como o Iraque, ou ao Brasil.
 
 
Mas, guerra significa economia ativa, só que a conta sempre vem aí e a economia tende a reduzir o seu ritmo e, talvez, entrar em recessão. O Brasil hoje tem mais reservas para enfrentar uma crise externa, mas os gastos públicos e a divida interna estão no espaço. O que acontecerá aqui caso a crise internacional anunciada se confirme?
 
 
Alckmin ou Luiz Inácio são uma equação com o mesmo “X”. A política econômica vai continuar a mesma, as opções medíocres e os pobres podem ficar sossegados: o Bolsa Família vai continuar pingando, com um ou outro, afinal qual é o político que vai querer desmontar um programa que lhe garante milhões de votos? Basta olhar como foi montado e qual foi o ritmo de crescimento no governo de Luiz Inácio para perceber o que há por trás desse “altruísmo” todo, e isso sem comparar a parte da renda que foi para o andar de baixo (copiraite Elio Gaspari) e a parte, infinitamente maior, que foi para o andar de cima. Já falamos nisso várias vezes aqui no Mont.
 
 
Uma coisa difícil de aceitar na pesquisa do Datafolha é a desvalorização da inteligência em nosso país. No Brasil, ser inteligente, desde que “inteligente” não seja sinônimo de “esperto” não vale muita coisa. Não estou aceitando o dado de “inteligência” do candidato tucano, mas atenho-me apenas ao conceito. Entre uma bunda e um cérebro, o Brasil tem optado e – ao que parece – optará sempre pela bunda.
 
 
É curioso verificar como alguém percebido pelos votantes como “mais inteligente, moderno e inovador”, possa perder as eleições para o posto mais importante da República.
É mais ou menos a mesma mensagem passada pelos 2,7% de eleitores que votaram na proposta do candidato-educação no primeiro turno.
 
 
Definitivamente, 97,3% do Brasil não parece preocupado com isso, não está interessado em esforço e conhecimento, contenta-se com paliativos, finge que é feliz e vai mergulhando cada vez mais e – irreversivelmente – numa mediocridade sem remédio.
 
 
Decididamente, o Brasil está se tornando o país sem futuro.
 
 
 

Crédito:Fritz Utzeri

Autor:Fritz Utzeri

Fonte:Universo da Mulher