Rio de Janeiro, 17 de Maio de 2024

Eleições 2002

Mais demoradas que os homens na hora de decidir o voto, as mulheres estão sendo vistas por muitos especialistas em marketing político como o fiel da balança nestas eleições presidenciais. Conquistar o apoio da indecisas ou das que ainda não consolidaram o voto pode ajudar a garantir uma vaga no segundo turno e até mesmo no Palácio do Planalto.

De acordo com a resposta espontânea --aquela na qual o entrevistador não mostra o nome dos presidenciáveis-- na última pesquisa do Datafolha, 53 por cento das mulheres entrevistadas ainda não sabem em quem votar, contra 29 por cento dos homens.

``O voto da mulher é decisivo"", afirma o marqueteiro Carlos Manhaneli, presidente da Associação Brasileira de Consultores Políticos. Segundo ele, esse segmento poderá dar a vitória ao candidato que melhor souber atraí-lo.

``Há 20 ou 30 anos, as mulheres seguiam o voto do marido. Hoje, nos grandes centros e cidades maiores, elas já têm independência de voto"", comenta o consultor.

As mulheres também já são maioria do eleitorado, representando 50,8 por cento dos votos, de acordo com dados oficiais. São 58,6 milhões de eleitoras contra 56,4 milhões de eleitores.

Líder nas pesquisas, com 37 por cento das intenções de voto na resposta estimulada, Luiz Inácio Lula da Silva, da coligação encabeçada pelo PT, tem mais votos femininos que os outros candidatos. Embora continue impressionando mais os homens que as mulheres. Enquanto 42 por cento dos homens dizem preferir Lula, a intenção de voto entre as mulheres é de 32 por cento.

Mas se Lula é o preferido pelas mulheres, é também o que mais sofre rejeição por elas, com 35 por cento, seguido por Anthony Garotinho (PSB), com 27 por cento. O candidato governista, José Serra (PSDB-PMDB), tem a rejeição de 23 por cento do eleitorados feminino, e Ciro Gomes, da Frente Trabalhista, tem 24 por cento.

E Ciro conseguiu marcar um gol contra com o público feminino, na semana passada, ao afirmar que o principal papel de sua mulher, Patrícia Pillar, era ``dormir"" ``com ele.

Ciro tentou consertar, dizendo ter feito ``uma brincadeira"". Mas, segundo os especialistas, o presidenciável errou feio ao irritar as feministas e chocar parcela tão importante do eleitorado justamente num momento de queda nas pesquisas.

RITA E PATRÍCIA SÃO TRUNFOS

De acordo com o Datafolha, a candidatura de Serra foi a única que cresceu entre as mulheres com o início do horário eleitoral. O número de entrevistadas que disseram apoiar o tucano pulou de 15 por cento para 21 por cento, enquanto o número de homens subiu de 12 por cento para 17 por cento.

A intenção de voto em Ciro, entre as mulheres, caiu de 25 por cento para 19 por cento. Lula, que tinha 33 por cento dos votos femininos perdeu um ponto percentual, e Garotinho manteve os 13 por cento.

Marqueteiros e feministas acham que o fato de Serra ter em sua chapa uma vice como Rita Camata, deputada que se destacou na luta por questões sociais, ajuda a atrair o voto feminino.

``E também o masculino"", opina Emanuel Públio Dias, da Escola Superior de Propaganda e Marketing de São Paulo, observando que a mulher tende a ser vista pelos dois sexos como ""mais honesta"".

Patrícia Pillar também é considerada uma arma importante na luta pelo voto das mulheres. ``É um trunfo de Ciro"", comenta Dias. Segundo ele, o fato de Patrícia ser um atriz conhecida, com carreira e postura irrepreensíveis, faz com que as mulheres vejam com simpatia a sua campanha por Ciro, que ficou ao lado da atriz durante o tratamento contra o câncer de mama.

A socióloga Eva Blay, do Núcleo de Estudos da Mulher e Relações de Gênero da USP, ressalta, no entanto, que a simples presença de uma mulher na chapa não garante o apoio das eleitoras. ``Não é qualquer mulher que ajuda a atrair o voto feminino. São determinadas mulheres que ajudam"", esclarece.

Do mesmo modo, achar que uma mulher votará num candidato ""só por ele ser bonitinho"" é, segundo ela, desqualificar a mulher.

Eva diz que as mulheres estão bastante preocupadas com as questões do cotidiano, com a saúde e com a qualidade de vida e tendem a apoiar os candidatos com propostas mais próximas dos interesses delas e da camada social a que pertencem.

As pesquisas, segundo Dias, mostram que já não existe discrepância entre os votos dos homens e mulheres. A diferença é que a mulher leva mais tempo para escolher o candidato.

``As mulheres tendem a tomar uma decisão mais tarde por se interessarem menos por política e por fazerem um consumo menor da mídia"", explica o especialista.

LULA EMOTIVO

Para o PT, o alto índice de rejeição de Lula entre as mulheres se deve mais à falta de informação sobre o candidato que a qualquer outro fator.

``A rejeição ao Lula decorre de (as mulheres) não saberem o que ele pensa sobre determinados assuntos. Vem do não conhecimento e da imagem (negativa) construída pelos adversários"", afirma Clara Ant, coordenadora do programa de governo do candidato.

Segundo ela, as lágrimas que Lula derramou recentemente, na propaganda eleitoral, ao relembrar a morte da primeira mulher no parto não foram para sensibilizar as mulheres, como avaliaram alguns analistas.

``O Lula é assim. Não foi uma construção para ganhar voto feminino"", afirma Clara. ``Ele é um homem que tem afeto. Quando o Henfil morreu, Lula se desfez em lágrimas. As pessoas estão tendo a oportunidade de conhecer o Lula que nós já conhecemos"", acrescenta.

Dias concorda que a rejeição a Lula está relacionada, principalmente, ao fato de alguns setores ainda associarem o candidato a idéias radicais de esquerda. Na opinião dele, o grande mérito da atual campanha petista é o de estar tirando o medo que homens e mulheres tinham do PT.

Manhaneli acha, contudo, que Lula ainda sofre, junto ao eleitorado feminino, dos resquícios do ``fator Miriam"" -- uma referência a ex-namorada do candidato que, na campanha de 1989, o acusou, na TV, de ter oferecido dinheiro para que ela fizesse um aborto.

``Foi um episódio muito marcante, que ainda está no inconsciente coletivo"", afirma o consultor político, para quem o caso ainda será ressuscitado e explorado no calor da campanha. Já Dias acha a tese do colega pouco provável. ""Ninguém mais lembra disso"", comenta.
 

Crédito:Anna Beth

Autor:Marcia Detoni

Fonte:Reuters