Rio de Janeiro, 29 de Março de 2024

Problemas para Engravidar: Mãe ou Maria?

Casais que enfrentam problemas  para engravidar costumam criar modelos ideais de maternidade e paternidade


                 Quando um casal se depara com uma dificuldade para engravidar, se depara também com uma série de questionamentos. Primeiro, eles buscam entender qual a parte do corpo que não está funcionando direito: ambos se submetem a uma série de exames, muitas vezes, doloridos ou constrangedores, para entender o porquê o bebê não vem. Passada essa fase, começam os questionamentos individuais.

               Por mais que o médico apresente um diagnóstico físico para o problema, os casais costumam formular muitas indagações pessoais sobre “o porquê que estão tendo que passar por isso”. Nos casos onde não existe uma causa física para o problema  - infertilidade sem causa aparente - esses questionamentos costumam vir com maior força.

               Percebo, por meio da prática clínica, que diante do vazio de respostas, cada pessoa busca preencher essa falta com um recheio muito particular, na maioria das vezes, busca no passado situações onde acredita ter errado e por isso agora está sendo punida.

               É comum aparecerem pensamentos de que não se consegue engravidar devido a brigas anteriores com familiares, abortos cometidos no passado, traição do companheiro (a), sentimentos hostis vivenciados... Enfim, qualquer coisa que possa justificar para si, “tamanho castigo”. Parece que há um resgate, no caso das mulheres, do modelo de ideal de mãe: Maria, mãe de Jesus, elas começam a pensar que precisam ser quase perfeitas para gerarem como ela.

               Percebemos também que alguns casais passam a acreditar que todas as áreas de suas vidas precisam estar equilibradas para a gravidez acontecer, como se um desequilíbrio em qualquer setor pudesse estar desencadeando a infertilidade. É fato que uma pessoa em equilíbrio têm melhores condições emocionais para gerar um filho, mas o que chama a atenção é esse modelo ideal que os casais costumam criar (e se cobrar) para atingirem a gravidez.

100% não existe...

               Um casal não precisa estar 100% feliz no casamento para um filho vir, 100% satisfeito nas relações familiares ou com seu desenvolvimento pessoal para isso acontecer. O ideal é algo diferente da realidade e podemos estar um pouco descontentes com algumas coisas em nós ou em nossas relações, mas, mesmo assim, o bebê pode acontecer, pois todos somos, de alguma forma, faltantes em algo.

               Não há um porquê para a vivência da infertilidade, não há respostas precisas sobre quando a gravidez irá acontecer, ela não é previsível ou controlável. No entanto, enquanto ela não acontece, podemos ir além do sofrimento - já que esse é inevitável - e utilizar essa experiência como parte do amadurecimento pessoal e do casal.

               Casais que vivenciam a infertilidade acabam tendo um tempo maior para desejarem o filho e pensarem seus papéis de pais e sua vida conjugal em relação aos casais que engravidaram sem nenhuma dificuldade. Muitos estudos com famílias que utilizaram tecnologias de reprodução assistida apontam que essas famílias possuem pais mais dedicados, mães mais afetivas e desempenhando melhor sua função maternal, quando comparadas às famílias que conceberam naturalmente.

               Desta forma, percebe-se que o sofrimento trazido com a dificuldade de gravidez gera amadurecimento e pode contar a favor para a constituição da nova família.             

 

Luciana Leis é psicóloga da Clínica Gera.

É especializada no tratamento de casais com problemas de fertilidade.

Fale com ela: luciana_leis@hotmail.com

www.clinicagera.com.br

 

Crédito:Cris Padilha

Autor:Márcia Wirth

Fonte:Universo da Mulher